O jogo YS, 101 Asanas
Jogo da memória com nomes dos asanas e os desenhos feitos a mão. Divididos em 4 tipos de posturas de acordo com os 4 elementos. 202 cards de papelão de 5x5 cm.
Relato jogo YS
Por Simone André
O jogo SY foi realizado como trabalho final da formação em Yoga (em 2017/18) e a partir de uma dificuldade minha. Eu tive um AVC por trombose em 2015, que foi uma espécie de pandemia particular, me isolando em casa e obrigatoriamente parando todos os trabalhos, quando e então u aproveitei como parte da reabilitação criar o jogo.
Nada do que fiz nesse joguinho é novo ou original, é um jogo da memória, embasado nos quatro elementos presentes em uma sequência de asanas de aula de Yoga. O que é significativo foi a minha experiência ao fazer esse joguinho. O caminho que me levou à busca e as descobertas que fiz durante a formação, me levaram a sistematizar esse conhecimento, por compreender que pode ser proveitoso para outros praticantes ou instrutores.
Como sequela, eu não enxergo 1/4 da visão e a mão direita ainda treme, agora - 8 anos (2023) depois - bem pouco, graças à neuroplasticidade do cérebro, a disciplina e a Yoga. A região do cérebro atingida foi a occipital e o equilíbrio também foi prejudicado, porém a Yoga contribuiu para a sequela ter sido pequena. O equilíbrio firmado pelos asanas e a consciência do corpo ajudaram na recuperação mais rápida.
Vários motivos podem justificar o AVC por trombose que tive, podemos chamar de stress a combinação de todos juntos. O isolamento causado pela "pandemia particular" da trombose, realizou um sonho antigo que a minha vó e minha mãe puderam tornar realidade:
a possibilidade de fazer a formação em yoga.
Enquanto nas academias de ginástica havia a visão militarizada do corpo, descobrir e conhecer a filosofia, o embasamento que sustenta o prazer que eu sinto pós-prática, o bem-estar, a concentração e a clareza de ideias, modificou o meu relacionamento com a Yoga que praticava há uns 20 anos.
Mas naquele momento pós-avc tudo era receio. Eu sentia dificuldade em fazer os asanas, em abaixar a cabeça, fazer as posturas invertidas, portanto ganhar a confiança novamente no meu corpo, "o lar de mim", foi aos poucos que se deu. E foi na formação que foi feita no Bliss Yoga, com o Coaracy, onde agora funciona o “Museum of Yoga”, que decidi como trabalho final de curso.
Como eu não tinha interesse em trabalhar imediatamente com isso, novamente agi com a minha dificuldade que era lembrar dos nomes em sânscrito para cada um dos asanas, e claro lembrar das sequencias que tanto bem me faziam. Daí surgiu a ideia-necessidade de um joguinho da memória. E foi um trabalho de pesquisa e descoberta e segurança e exercício prático para mim.
Enquanto eu desenhava à mão as posturas, eu exercitava a visão e avançava para pesquisa ao descobrir as histórias e técnicas que repousam a cada asana. Usava livros, sites, lia sobre filosofia, os livros do Iyengar foram como bússolas e o funcionamento da língua do sânscrito e a construção das palavras, também.
Passei a perceber como uma forma de sentar, de repousar. Perceber que também fazemos asanas na forma como sentamos para ver TV, por exemplo. E compreender o corpo vivo, em que cada vez que repousamos "assentamos" uma forma, estamos ativando esse ou aquele chakra, essa ou aquela região no corpo.
Compreender que cada uma dessas posturas que fazemos no automático mesmo, está dizendo sobre uma resposta do meu corpo para mim. Por exemplo, qual é a sua postura de relaxamento mais comum? Aquela que quando vê você já está assim? Deitada, sentada?
Cada postura que fazemos sem ser um asana da tradição do Yoga conta muito sobre você, sobre um momento de vida. E pensar no tempo que permanecemos sentados a frente da tela de um computador então! Eu após o AVC fiquei muito tempo sentada, muito tempo deitada, muito tempo em casa me recuperando, foi um longo caminho, como nascer de novo.
Um longo savasana, com apoio, tendo o relaxamento, as vontades como processo de uma das posturas que dividi com sendo equivalente ao elemento terra. A confiança de que o meu corpo está ali, repousando, tendo apoio, algo que meu corpo precisa perceber e sentir principalmente após um trauma como o AVC que modificou toda a minha vida.
Fiz esse joguinho também pensando nesses quatro elementos que fazem parte de uma aula de yoga: terra, fogo, água e ar. Apesar de ter sido um caminho que percorri para a pesquisa da filosofia por trás dos asanas, ele é um jogo para ajudar a montar uma aula.
Descobri que quando as aulas eram montadas trazendo a presença dos quatro elementos, me sentia melhor, e fazia mais sentido pro meu corpo e pra minha prática, tendo a percepção das posturas como um exercício de sensibilidade.
Nas posturas de equilíbrio, perceber como a sustentação do corpo e o peso em relação ao ar. Como é o seu corpo ocupá-lo nesse espaço repleto de ar, do que a gente não vê. Como eu percebo meu eixo, a parte do corpo que está mais solta no ar. Tudo isso pra mim é uma reflexão, um pensamento, uma quase meditação nos asanas.
Os asanas de torção foram uma descoberta em relação à limpeza do corpo, como se fosse uma prática de acupuntura pontos de energia do corpo que guardam vivencias, experiencias e mais concretamente toxinas, e como espremer e torcer estimular os pontos energia. Espremer e torcer ajudar na circulação e na limpeza do que não vemos, hormônios e substancias que circulam a todo momento expressando sentimentos.
A e água, elemento que coloquei para as invertidas. A inversão que é uma outra forma de raciocinar também. As posturas invertidas que fazem com que você inverta a força da gravidade do sangue no seu corpo. Você atuar de alguma forma oposta à gravidade, isso já permite que seu corpo ganhe novos espaços, ou olhares para si mesma.
Eu brinco, quando faço a prática de Yoga, pra mim, é muito como se fosse um exercício de pontos de vistas diferentes sabe? Olhar e ter visões de pontos de vista diferentes do que tem quando anda, senta, ou deita, faz com que trabalhe também no cérebro percepções diferentes.
E eu acho que perceber a diferença dos pontos de vista hoje em dia é essencial pra gente. Acho que sempre importante, mas essencial pra essa nossa cultura, pra esse nosso momento histórico, pra essas mudanças que estão ocorrendo.
Tem quatro anos que eu não pego nesse joguinho. Quando eu resolvi "materializar", eu procurava algo fora de ser professora do estado que seria uma forma de viver fazendo algo que eu goste, que me faça sentido.
Agora em Paraty é um lugar bem mais tranquilo, menos barulho de carros, consigo fazer tudo de bicicleta, com cautela. Pois a segurança de já conhecer o lugar me possibilita prestar mais atenção no presente, talvez isso também tenha ocorrido com o processo de desenhar e pesquisar sobre os asanas.
E até hoje, a pesquisa me rende reflexões, quando em uma aula de Yoga faço um asana, estou carregando aquelas histórias todas que fizeram criação daquela postura, seja história mitológica como a gente entende hoje. Seja história de um mestre.
E eu me pergunto o que de filosofia a tradição dos povos originários que aqui viviam, continuam vivas e partilhadas como conhecimento? Ainda temos acesso nos dias de hoje? Ou que filosofias as tradições dos povos africanos nos chegam hoje? E qual é a compreensão do lado espiritual do que resgatamos e do que mantemos como tradição ou como verdade hoje?